3 POEMAS
Hoje deixei a cidade
e entreguei ao mar
certas saudades de criança.
Enlacei o olhar no horizonte
e corri, sem prazo ou demora
lançando sobre as cristas das ondas
um fôlego de glória, mais que fuga
na lonjura, silvo de sal
em meu sonho inaudito.
Depois, tornei ao mudo espanto das tardes,
ao assombro dos recados que há na espuma
como se o mar deixasse na pele
a delonga de um poema
erigido na quimera de um grito.
É de novo o tempo das magnólias,
de sorver os seus pomos de púrpuro veludo
erguidos na direcção das luminescências do frio.
É sempre um fortúnio
esta perfeição da serenidade
que seduz a vida no caudal da esperança,
clarividência entre as vertigens do inverno
e os segredos da primavera.
Sabes, o fulgor não se esgota
no fragmentar dos sentidos
sempre que o silêncio nos amacia
a aspereza e os abismos
da pele.
E então, a incerteza é o olhar do infinito,
a sua janela entreaberta sobre o susto e o deslumbre.
SUBMERSÃO
As aves sustêm o corpo
sob os instantes em que viajam.
E permanecem nessa voragem
em que consentem o dom silente
à planura dos ventos.
Ou evocam somente um retorno
ao fulgor das primaveras em que renasceram.
É nisto que alguns homens se aproximam das aves:
no seu movimento ininterrupto de liberdade,
ocupados por sonhos e risos,
submergindo-se em bandos de distância
como se recriassem o seu inapreensível território
onde se conciliam com a exaustão do sublime.
Paulo José Costa nasceu em Leiria, onde reside e exerce actividade profissional enquanto Psicólogo Clínico. No domínio da Poesia, publicou Sopro da Voz (2011); Vizinhança de Olhares (2014); Casa Alta (2017), finalista da short-list dos Prémios Pen Clube Português (Categoria Poesia), Se um Dia Voltares (2019) e Nas suas Casas os Homens (2021). Encontra-se representado em diversas antologias de poesia em Portugal e Espanha; integra o projecto poético-musical CASA-NAU e tem colaborado na programação do Evento Literário RONDA – Leiria Poetry Festival na cidade de Leiria. É co-editor da ACANTO – Revista de Poesia.
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